quinta-feira, 5 de abril de 2012

O mais Belo dos dias


Hoje, quinta-feira Santa, antes de entrarmos no grande silêncio da noite de adoração, celebraremos a ceia, a grande Ceia do Senhor, aquela para a qual toda a humanidade é convidada.

Eu penso como seria para nós se soubéssemos que a refeição que iriamos fazer seria a nossa derradeira, como prepararíamos esta mesa, quais amigos convidaríamos para estar ao nosso lado e mais, até onde seríamos capazes de nos manter serenos e confiantes.


A celebração da quinta-feira santa é a última ceia de Jesus, e Ele diferente de qualquer outro, já sabia pelo que iria passar. Assim, sabendo de tudo o que estava para acontecer, tratou de reunir os amigos e lhes apresentar seu “testamento”; é neste cenáculo que Ele parte e partilha o pão, partir e partilhar são gestos de cuidado, hospitalidade e carinho, assim o faz o pai de família que alimenta os filhos, o amigo que recebe o visitante e também aquele que divide com quem necessita; porém o gesto de Jesus nesta ceia adquire uma profundidade inteiramente nova: Ele dá-Se a Si mesmo, é o próprio Amor de Deus que se manifesta na distribuição, assim este ato concreto torna-se o símbolo de todo o mistério da Eucaristia e se perpetua no tempo.

Este dar-Se a Si mesmo, o entregar-Se de Jesus e sua ordem ao final da ceia: “Este cálice é a nova aliança em meu sangue. Todas as vezes que dele beberdes fazei isto em minha memória” (1Cor 11, 25b); evidenciam que aquilo que a Igreja celebra na missa não é a última ceia, mas sim o que o Senhor, durante a Última Ceia, instituiu e confiou à Igreja; celebramos o memorial da sua morte sacrifical, pois, sabemos da sua ressurreição. Jesus dá aos discípulos o seu corpo e o seu sangue como dom da ressurreição.

Momentos fundamentais de Jesus, que mudam a história da humanidade, são vividos naquela mesma sala antes da Ceia; primeiro Jesus assume a condição de servo, de escravo: “levantou-se da mesa, tirou o manto, pegou uma toalha e amarrou-a na cintura. Derramou água numa bacia e começou a lavar os pés dos discípulos, enxugando-os com a toalha que estava cingido.” (Jo 13, 4-5); este é o sentido salvífico do seu serviço, Ele despoja-Se do seu esplendor divino, ajoelha-se diante de nós, lava e enxuga nossos pés sujos, para que possamos participar do grande banquete do Senhor.

Outro momento fundamental daquela quinta-feira reside nos discursos de despedida, que atingem o seu clímax na oração sacerdotal, Jesus fala da sua saída do Pai e de seu regresso a Ele. O sair é a descida até nós, não como declínio ou queda, mas como aproximação para nos trazer o verdadeiramente divino, Jesus desce a nós por causa do Amor incondicional de Deus pelos homens. E seu regresso para o Pai se faz com uma novidade - Jesus agora, não regressa sozinho, Ele não abandona sua humanidade. Em sua descida Ele assumiu a condição humana, viveu entre nós e nos amou até o fim; no seu retorno ao Pai nos atrai a Ele (Jo 12,32), deixando o caminho aberto para que todos nós passemos também um dia à vida gloriosa.

Porém, pouco adianta todo o comprometimento de Jesus para conosco, esse Amor Ágape de Deus que entrega-Se na cruz por intermédio de seu Filho amado, se não formos hoje capazes de viver nossas vidas conforme o testamento de Jesus na Ceia da quinta-feira Santa. O mundo atual vive sufocado pelo relativismo, pelo monetarismo e pelo interesse, somos uma sociedade de troca e barganha; produtos e serviços são avaliados e trocados o tempo todo, muitas vezes barganhamos também sentimentos, corpos e relacionamentos. Um estudioso moderno certa vez declarou: “o amor é um fenômeno marginal na sociedade contemporânea”.

Se a Igreja hoje passa por tribulações, este é o momento de olharmos para a quinta-feira santa de Jesus, assumir nosso papel de cristãos (seguidores de Cristo) e como Ele viver o Amor de modo proativo e criativo, nos entregando ao serviço com a mesma humildade daquele que tudo podia, mas amarrou uma toalha na cintura e ajoelhou-se para lavar nossos pés.

Que a quinta-feira Santa, o dia da instituição do sacerdócio ordenado e do sacramento da caridade, seja o dia para contemplarmos e refletirmos sobre o inesgotável amor de Deus; e olhando o Deus que se abaixa para lavar nossos pés de modo a nos tornar limpos, o Deus que se entrega para nos alimentar a fim de que nele estejamos unidos e nos tornemos um só no Pai, enxerguemos Deus em cada um de nossos irmãos, que a Eucaristia se torne o ápice de nossa vida cristã, ecoando por todos os nossos dias e se renovando com generosidade sempre.

Carlos Rissato

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